Eu digo NÃO!

Em defesa da língua portuguesa, o autor deste blogue não adopta o "acordo ortográfico" de 1990 por este ser inconsistente, incongruente e inconstitucional, para além de, comprovadamente, ser causa de crescente iliteracia em publicações oficiais e privadas, na imprensa e na população em geral.


12/07/2014

Histórias do barro VI


Ana Lopes Gonçalves Valada, vulgo Ana “Baraça”, nasceu, em (Galegos Santa Maria), a 26 de Maio de 1904.
Filha de Manuel Valada e Luísa Lopes, memoráveis artesãos deste concelho, começou a fazer “bonecos” muito cedo. Com sete anos fez as primeiras peças, principalmente galinhos, e aos 15 já colocava as suas próprias criações no forno do pai. 
Na feira de Barcelos, juntamente com os seus pais, vendia o pequeno e modesto figurado a 10 réis cada peça. 
Devido às dificuldades económicas viu-se, temporariamente, afastada do barro quando foi servir na lavoura, até aos dezassete anos. Esta razão influenciou bastante as temáticas e estéticas que, mais tarde, utilizou nas suas criações. 
Casou, a 28 de Maio de 1935, com Manuel Pereira, também ele oleiro e rodista. É deste casamento que surge o apelido “Baraça”. O seu marido, quando era solteiro, tocava viola nas romarias das freguesias, instrumento que enfeitava com “baraças” (tiras em tecido) que ficavam penduradas e que chamava a atenção dos viandantes. Também porque usava uma “baraça” nas calças no lugar de um cinto. O apelido “pegou” e, indexado a “Ana”, consagrou-se no artesanato barcelense. 
Depois de casada, dedicou-se à feitura de galos, durante cinco anos, que pintava cautelosamente com a ponta de um prego, método que manteve em segredo bastante tempo. 
Após um parto complicado, que a deixou com a saúde debilitada, abandonou a produção de galos e retomou, definitivamente, o figurado. Tornou-se uma das maiores criadoras deste tipo de artesanato na região com peças, essencialmente, ligadas à agricultura, tais como juntas e carros de bois e arados. 
Modelava tudo o que a rodeava, de uma forma terna, mas carregada de simbolismo e expressão única. 
Os seus métodos de trabalho eram puramente artesanais e de uma grande singeleza. O barro tratado manualmente com a enxada, a criação das figuras feitas à mão, sem a ajuda de qualquer molde, o forno de cozedura bastante primitivo, em pedra e a lenha, a veracidade das suas pinturas manuais, muito coloridas e atractivas, foram elementos que caracterizaram a arte desta artesã. 
Figura tutelar do artesanato barcelense, referência artística, Ana “Baraça”, aos 81 anos, foi condecorada pelo Presidente da República, a 8 de Março de 1985, com o grau de Oficial do Infante D. Henrique, em homenagem à sua vida e obra artística. Ana “Baraça” era uma mulher alegre, com um sorriso permanente, irradiadora de uma confiança e autonomia incrível. 
Faleceu, a 27 de Março de 2001, com quase 97 anos, deixando para trás uma vida feita de “barro”. Deu ao figurado de Barcelos uma projecção única, só comparável à acção de Rosa “Ramalho” e Rosa “Côta”. 
A criatividade e simplicidade desta mulher do povo, campestre e humilde, marcaram uma expressão artística muito própria, ainda hoje referencial numa das famílias consagradas da arte popular – os “Baraças”, nome que ela própria imortalizou e legou ao artesanato local.
(In C. M. Barcelos)

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